O período é o Cretáceo. A idade é o Santoniano, há mais ou menos 85 milhões de anos. O local é o noroeste paulista, região de Ibirá, onde viveu um predador cujo nome inspira morte (do grego thánato), mas também o nome de um dos grandes vilões da Marvel, que já deu muito trabalho para a equipe de super-heróis Os Vingadores.
Thanos simonattoi foi um dinossauro carnívoro (terópode) do grupo dos abelissauros (répteis de Abel) que viveu no fim da Era dos Dinossauros em terras brasileiras. Thanos foi descoberto por uma equipe do Museu de Paleontologia ‘Prof. Antônio Celso de Arruda Campos’, na cidade de Monte Alto, e parcialmente descrito em 2014 por paleontólogos da Argentina e do Brasil. No entanto, apenas em 2018 é que seus restos foram completamente descritos por paleontólogos da Unicamp (Dr Rafael Delcourt) e de Monte Alto (Dr Fabiano Iori, também presente na descoberta e descrição parcial de 2014). Esse dinossauro representa uma novidade em termos de Brasil e para o próprio grupo em que faz parte.
No que diz respeito à novidade brasileira, Thanos é a primeira espécie de dinossauro carnívoro descrita formalmente para o Grupo Bauru, unidade geológica do Período Cretáceo Superior. Essa unidade geológica abrange partes dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Goiás e parte do Paraguai. Até o presente momento eram conhecidas diversas espécies de dinossauros saurópodes (os “pescoçudos”) dessa unidade geológica, como por exemplo o Austroposeidon e o Maxakalisaurus; além de muitas espécies de crocodilos. No entanto, os restos de dinossauros terópodes ainda eram muito escassos e não diagnosticáveis. Thanos, apesar de ser representado por poucos materiais, mudou esse paradigma, e hoje é a primeira espécie de terópode oficial.
Thanos também mudou a visão da morfologia tradicional dos abelissauros, por possuir uma vértebra cervical (do pescoço) mais pneumática que os demais (ou seja, com “buracos” mais fundos), além de possuir um processo ventral em forma de quilha, reforçando a inserção da musculatura do pescoço. Os abelissauros são dinossauros conhecidos também por possuírem estruturas (chifres e tecido córneo) na cabeça, além de pescoços muito fortes, fazendo com que os bichos pudessem dar cabeçadas em outros rivais ou em presas. Essas cabeçadas não seriam como as dos bodes ou touros, mas sim lembrando iguanas marinhas e girafas. No caso, provavelmente os abelissauros são os únicos dinossauros carnívoros que poderiam ter esse tipo de comportamento, justamente pela presença dessas estruturas. Embora não se tenha encontrado material craniano do Thanos, é bem provável que ele tivesse alguma ornamentação na cabeça, como seu famoso primo Carnotaurus, da Argentina.
A classificação do Thanos é a mesma do Carnotaurus, Skorpiovenator, (ambos da Argentina) e do Pycnonemosaurus, que viveu também no Brasil alguns milhões de anos depois, na região do Mato Grosso. Portanto, juntamente com essa espécie, Thanos e Pycnonemosaurus, são as únicas espécies de abelissauros descritas para o Brasil.
Um outro fato curioso é que Thanos, apesar de ser um grande predador (entre 5.5 e 6.5 metros de comprimento), não foi o maior da região, mas sim um terópode do grupo dos megaraptores, que poderia alcançar aproximadamente 9 metros de comprimento. Dessa forma, o dinossauro de Ibirá tinha que competir (ou fugir) de predadores maiores e talvez mais mortíferos. A expectativa é que novos trabalhos de campo com as equipes da Unicamp e de Monte Alto possam recuperar mais materiais do Thanos, e quem sabe encontrar novas espécies. Ainda há muito o que se fazer e muitos materiais para serem encontrados.
*Rafael Delcourt é aluno de pós doutorado do Instituto de Geociências da Unicamp.